Planejamento de pessoal em tempos de retração do emprego
A redução de 345 mil empregos formais no primeiro semestre, apontada pelos dados do CAGED, confirma que estamos num processo de enxugamento dos quadros por parte das empresas e sinaliza a profundidade da crise atual, que pelas projeções oficiais só não será maior do que a recessão verificada em 1990, quando o PIB encolheu cerca de 4% no ano.
Nestes últimos 25 anos, observamos diversas empresas adotarem, diante de sucessivas crises, um comportamento similar ao vivido agora, caracterizado por um ajuste severo da força de trabalho; para logo em seguida adotar uma postura mais flexível, quando o ambiente se tornava mais favorável. Num comportamento similar àquele do indivíduo que tenta sucessivas dietas para lidar com o problema de obesidade, sem mudar fundamentalmente seu estilo de vida.
Da mesma forma que dietas drásticas e mal sucedidas podem trazer consequências graves para as pessoas, sucessivos enxugamentos abruptos de quadro podem trazer impactos danosos para o tecido organizacional, tais como o enfraquecimento da cultura, a quebra do comprometimento e da confiança, a perda de know-how estratégico e da capacidade de inovar.
Embora crises como a que estamos vivendo apresentem impactos que são difíceis de serem antecipados, acredito que a prática do planejamento de pessoal seja um recurso importante para mitigar a repetição do “efeito sanfona” e garantir que a empresa se mantenha com uma estrutura “fit” para enfrentar seus desafios.
Duas dimensões precisam ser tratadas de maneira integrada no planejamento de pessoal: a qualitativa, relacionada com o perfil necessário da força de trabalho, e a quantitativa, voltada para a definição do tamanho da organização no futuro.
Quando se discute o perfil que será necessário para a força de trabalho é importante levantar algumas questões críticas, tanto relacionadas com fatores internos como com o ambiente de negócios. Por exemplo:
- Quais serão as competências estratégicas necessárias para o desenvolvimento dos negócios da empresa no futuro?
- Onde estas pessoas vão trabalhar? Com que tipo de tecnologia? Qual será seu tipo de vínculo com a organização?
- Quais são as tendências demográficas? Quais são os valores e expectativas emergentes dos principais grupos que vão compor minha força de trabalho?
Já na perspectiva quantitativa, do ponto de vista interno, as questões críticas estão voltadas para o modelo futuro de operação da empresa, como ela deve se organizar, como a força de trabalho atual deve evoluir – se forem mantidos os parâmetros atuais de crescimento e turnover – e como o mercado deve se comportar em termos de disponibilidade ou escassez de talentos com o perfil desejado. As questões abaixo exemplificam o tipo de discussão na perspectiva quantitativa:
- Que mudanças significativas serão feitas na operação e na estrutura organizacional para atender a estratégia de negócios?
- Quantas pessoas a empresa vai precisar?
- Qual será nossa disponibilidade interna, considerando evolução natural da operação (turnover atual, projeções de aposentadoria, etc.) e nossa capacidade de formação de quadros técnicos e de liderança?
- Como deve se comportar o mercado de trabalho nos próximos anos em termos de oferta e demanda?
- De onde virão as pessoas que vamos precisar?
Após esta reflexão, o próximo passo é formular uma estratégia de pessoal e definir um conjunto de ações a serem implantadas no âmbito dos processos e práticas de RH e do design organizacional. Afinal, como em toda atividade de planejamento, não se trata aqui de construir uma bola de cristal para a gestão de pessoas. Mas tomar as decisões hoje para melhor equipar a empresa para lidar com os cenários de amanhã, evitando que ela sofra demais com ajustes traumáticos do seu quadro e fornecendo as condições para superar os seus desafios.
Fonte: Joao Lins