A culpa é de quem?
As crianças choraram
Vieira Junior
Luiz Felipe Scolari, o Felipão, é o mais novo vilão dos brasileiros. O homem aclamado em 2002 como campeão mundial agora é simplesmente detonado pala mídia e pelo povo brasileiro pela pior derrota da seleção em toda a história. “Ele errou. É culpado”, dizem os célebres comentaristas com ar de seriedade e razão. “Se não fosse escalado assim, seria diferente”, completam. Mas, será? Ou é apenas mais confortável pensar assim?
Eleger alguém como culpado pela incapacidade e falta de planejamento é especialidade do nosso povo, atitude que se assemelha à de verdadeiras crianças quando o assunto é creditar vitórias e derrotas. Talvez seja preciso reconhecer a superioridade sete vezes maior de um adversário que se preparou, planejou e conquistou o seu objetivo com muitos méritos. É preciso crescer e deixar de ser tão infantil, culpando um ou outro quando a bola não entra, a economia não anda, o hospital não funciona e o político não cumpre a promessa. O Brasil perdeu para a sua incapacidade, desorganização e amadorismo que outrora afetou outros setores, mas chegou também ao futebol.
Portar-se como criança em momentos de dificuldade parece ser parte do DNA do brasileiro. Isso é evidenciado tanto no futebol quanto em outros momentos. De forma muito rápida, podemos citar o eleito culpado pela derrota na Copa de 1990: Dunga. Contudo, todos concordam que aquele time era péssimo. Em 1994, o salvador era Romário, o homem que devolveu a honra e a alegria ao povo que chorava a perda de outro ídolo, Ayrton Senna. As histórias se repetiram e vão continuar a se repetir. Como crianças, o povo elege culpados nas derrotas e heróis nas conquistas. Quando ganha, canta, dança, pula e faz festa. Quando perde, chora, se desespera e fica traumatizado. Trauma por um jogo de futebol? Quanta infantilidade…
O brasileiro deveria se sentir envergonhado de não possuir serviços públicos com o mínimo de decência. Trauma é perder um parente porque o exame foi marcado para depois de seis meses. Frustrante é ver professores apanhando de alunos e presos recebendo pensões acima do salário mínimo enquanto os idosos, que trabalharam a vida toda para construir o país, têm que decidir se compram remédio ou comida. Como as crianças, o povo ainda não sabe eleger prioridades e decidir se é mais importante comer a sobremesa ou o almoço.
É preciso crescer, agir, viver e sentir os problemas e as glórias como adultos. Ter a consciências do que é vida real e o que é apenas entretenimento. Futebol é show, encanta e serve para brincar. Por ele, se lamenta a derrota e aceita que logo tudo vai melhorar. Por saúde, educação, segurança e tantas outras áreas básicas é que se deve chorar, lamentar e ficar traumatizado quando algo dá errado. De nada adianta ser hexacampeão na bola e sub-20 em saneamento, emprego, educação, etc., e nesses quesitos a Alemanha goleia o Brasil há muito tempo.
Esse comportamento infantil afeta o brasileiro em todos os momentos. “A economia não vai bem? Culpa da Dilma, vamos trocá-la!”, pensam alguns. “Não há emprego? Culpa do governador! Hora de mudar”, respondem outros. Mais infantil ainda é quando levam a discussão para o lado partidário. Então, se tornam crianças arrogantes, daquelas que levam a bola embora pra casa quando perdem o jogo.
Como os jogadores brasileiros diante da seleção da Alemanha, o povo está perdido em sua própria falta de conhecimento e planejamento. Assim, se elege vilões quando a vida não caminha bem e heróis quando tudo se resolve, mas se esquece da parcela de culpa de cada um. Não se pesquisa, por exemplo, sequer o currículo de um candidato antes de coloca-lo na direção do país. Assim, as crianças continuam chorando à espera de um herói, tanto no futebol como na vida.
Vieira Junior, jornalista, pós-graduando em Administração de Empresas pela Fundação Getúlio Vargas (FGV).