A crise política brasileira. E agora, Brasil?

Foto - Renan

Renan Rossi Diez (*)

Todos os artigos que publiquei até hoje, restringem-se ao universo do comércio exterior, abordando temas técnicos e atuais que objetivam auxiliar os leitores que se inserem neste contexto. No entanto, a situação em que o país se encontra, atualmente, exige uma alteração no roteiro e reserva-se no dever de enfatizar alguns pontos deste cenário que merecem ser objeto de reflexão.

A grave crise instaurada no cenário político, muito possivelmente a maior da nossa curta história democrática, além de evidenciar o abalo à imagem de nossa presidente, se agrava ao passo que a capacidade de governar se mostra ancorada, frente à falta de apoio político que o governo precisa para que ações de retomada sejam desenroladas. Diante desta incapacidade de governar, originária inicialmente em razão da ausência de credibilidade, deflagram-se, uma série de questões que refletem negativamente na vida do povo brasileiro.

A inflação deve continuar enquanto a crise política persiste. A expectativa é de que não evolua com a mesma força de 2015, porém, é óbvio que passará longe do ideal e acima da meta. O dólar também deve continuar cotado mais alto do que deveria, não fosse a crise política, a real situação econômica levaria nossa cotação a cerca de R$ 3,00 e R$ 3,50. O termo já disseminado no momento como convulsão social também é uma preocupação vigente, caso essa crise política não se resolva.

A questão do desemprego pode se tornar mais forte e a sensação de desespero ante a falta de perspectivas podem ocasionar manifestações cada vez mais fortes e incontroláveis. A restrição do crédito também preocupa, frente à inadimplência, o que justifica condições mais rígidas de financiamento.

O problema de uma crise política tão forte como essa é que o país momentaneamente fica ingovernável. Não há ações que permitam a retomada do crescimento enquanto o objetivo principal dos partidos políticos é desenvolver estratégias de defesa e ataque, visando apenas a manutenção do poder ou a destituição dele. Enquanto isso, quem sofre não é o governo, não é a oposição ao governo, é o povo, independente de classe social.

As manifestações representam a insatisfação de uma parte muito grande de eleitores. É notória a impopularidade de nossa presidente, que inclusive, durante seu governo atingiu o maior índice de reprovação da era democrática, superando o governo Collor em 1992. Do ponto de vista social, as manifestações ocorrem majoritariamente de maneira pacífica, são organizadas, representam a insatisfação de um povo, colaboram com eventuais mudanças que possam ocorrer e, portanto, cumprem seu papel na democracia. Do ponto de vista político, pode soar contraditório que pessoas que protestam pela saída do atual governo caminhem lado a lado nas passeatas com pensamentos políticos tão diferentes entre si. Porém, é fato que o denominador comum das manifestações é a insatisfação com o governo atual.

Observamos nas manifestações os mais variados cartazes, com dizeres do tipo “Moro para presidente”, “Fora PT” entre muitos outros, alguns muito criativos, politizados e oportunos ao momento atual e, claro, alguns outros que não merecem ser reproduzidos novamente nem como citação.

A sociedade pode sim valorizar as ações de uma pessoa em especial durante um processo jurídico que reflete diretamente no cenário político. A sociedade pode sim gritar sua insatisfação frente a um partido político específico. Por outro lado, a mudança acontece mais solidamente, mais facilmente, com mais credibilidade, quando o povo grita por ideologias e não por pessoas, sejam gritos de idolatria ou os alterados gritos de ódio.

Refutar ideologias é mais benéfico para a democracia do que repudiar pessoas. Valorizar ideologias é mais benéfico para a democracia do que enaltecer pessoas. O discurso ganha força, fica mais fácil de se entender o que a sociedade almeja, fica mais fácil de lutar contra algo que acreditamos ser ruim.

A crise está evidente, é possível entender alguns posicionamentos mais destemperados de todos os lados, porém, em momentos de crise, normalmente a lucidez se torna uma vantagem. Os que ultrapassam o limite da lucidez, sejam cidadãos comuns ou políticos, normalmente destacam-se negativamente e, ao fim da crise, acumulam reflexos mais negativos diante de suas ações do que conquistas durante o período.

Para finalizar, acredito que vale uma reflexão da filósofa Ayan Rand, judia fugitiva da revolução russa, que chegou ao Estados Unidos na metade da década de 1920. “Quando você perceber que, para produzir, precisa obter a autorização de quem não produz nada; quando comprovar que o dinheiro flui para quem negocia não com bens, mas com favores; quando perceber que muitos ficam ricos pelo suborno e por influência, mais que pelo trabalho, e que as leis não nos protegem deles, mas, pelo contrário, são eles que estão protegidos de você, e a honestidade se converte em auto sacrifício; então poderá afirmar, sem temor de errar, que sua sociedade está condenada.” Pode ser um discurso capitalista e talvez muitos não concordem, mas é totalmente cabível para o momento atual.

Como forma de alento, espero que essa crise política e seus reflexos na sociedade brasileira sejma um processo de evolução de nossa democracia. Nossa democracia é frágil, é curta, porém, assim como visto também em outros países que também passaram por grandes crises e saíram com suas democracias fortalecidas, a esperança é que isso ocorra no Brasil.

(*) Consultor Aduaneiro. Graduado em Direito pela PUC-Campinas. Pós Graduando em Administração de Empresas pela FGV-IBE e MBA em Gestão do Comércio Exterior e Negócios Internacionais pela FGV-IBE